NOTA DE REPÚDIO E DENÚNCIA – MARACANAÚ
NOTA DE REPÚDIO E DENÚNCIA
Sobre o desrespeito à Música e à Cultura como um todo na cidade de Maracanaú (CE)
Após uma entrevista concedida no início de junho de 2023 pelo prefeito de Maracanaú Roberto Pessoa à TV Jangadeiro, na qual ele afirmou que o São João de Maracanaú seria realizado com baixíssimo custo ao orçamento público e que a pretensão era zero ônus de erário do tesouro municipal, uma avalanche de denúncias recaiu sobre a gestão. O Comitê de Cultura de Maracanaú foi um dos primeiros a questionar esses valores e, encontrando facilmente os contratos no Portal da Transparência Municipal, inquiriu: “Se de fato o custo é zero para prefeitura, logo a Secretaria de Cultura e Turismo está com uma boa verba do tesouro para promover, fomentar, difundir e respaldar toda cena artística e cultural da cidade nas suas diversas linguagens”.
Uma farta documentação demonstra que um montante de mais de R$ 7 milhões saiu do orçamento municipal da Cultura para 2023 e foi utilizado para a contratação de shows e estrutura para o evento, marcado por uma programação repleta de shows famosos oriundos da indústria cultural e com cachês altíssimos, que em nada dialogam com as culturas juninas. Muitas dessas contratações já firmadas ainda em janeiro e fevereiro de 2023, segundo publicações no Diário Oficial do Ceará de 09/02/2023. Isso acontece ao mesmo tempo em que a Prefeitura Municipal de Maracanaú não apresenta uma política de cultura para o município, ou sequer uma programação regular de apresentações musicais. Ao contrário, acaba de destituir a Banda Sinfônica de Maracanaú, coagindo seus integrantes e demitindo o seu maestro, reconhecido e elogiado na cena musical nacional.
A Prefeitura de Maracanaú tem sistematicamente desrespeitado e desvalorizado o(a)s músico(a)s e demais trabalhadora(e)s da cultura do município, ignorando a potência criativa e a produção diversa que marca a cena cultural da cidade. Além do mais, a gestão prevarica ao não criar e desenvolver uma política cultural sistemática com programas claros e ações continuadas e, consequentemente, não investindo os recursos previstos para tal na promoção, fomento, difusão, formação, pesquisa ou manutenção da Cultura da cidade.
O Comitê de Cultura de Maracanaú e também o Fórum de Música da cidade apresentaram uma análise crítica dos contratos do evento São João de Maracanaú, cogitando uma hipótese de investimento desses recursos em política pública de cultura. A saber: “Só com o cachê do DJ Alok (R$ 475.000,00) daria para fazer em Maracanaú um festival de música (ou um projeto de shows semanais) com mais de 200 grupos ganhando um cachê de R$ 2.300,00, que é o dobro do que é pago pela prefeitura aos músicos que se apresentarão no São João de Maracanaú. Ou ainda seria possível pagar melhor: R$ 5.000 reais para mais de 90 apresentações culturais. Praticamente o triplo de apresentações que a prefeitura de Maracanaú contratou em 2022 de trabalhadora(e)s da cultura de Maracanaú…” (ver publicação em instagram.com/p/CtWq-EtL20w).
Para o mesmo evento, a Prefeitura de Maracanaú lançou um edital (no. 007/2023) convocando grupos musicais (e artistas de outras linguagens) para se apresentarem no início do evento, em palcos menores e com equipamentos secundários, em comparação aos dos shows famosos. O edital teve apenas três dias de período de inscrições (02 a 04/06), para mobilizar e selecionar projetos que seriam contratados a partir do dia 10/06. O orçamento oferecido para a categoria de Música foi de R$ 30.833,63, considerando contemplar 33 projetos, sendo que na categoria Música, os cachês oferecidos eram entre R$ 829,61 e R$ 967,87. Em outras categorias, o piso de cachê chegou a R$ 400,00 e o teto R$ 1.350,00 (todos valores brutos).
Em reunião realizada em 28/03/2023, entre o Comitê de Cultura de Maracanaú e a secretária de Cultura em exercício, que à época era coordenadora administrativa da secretaria, o pensamento que está por trás dessa política foi transmitido desta forma pela secretária: “- os artistas de Maracanaú não dão retorno para a Prefeitura, nem financeiro nem de público, por isso vocês não podem esperar que a Prefeitura pague um cachê melhor pra eles”.
Repelimos veementemente este tipo de pensamento preconceituoso e ao mesmo tempo perverso e em total dissonância com o decreto do Ministério da Cultura no. 11.453, publicado naquela mesma semana, que orienta fomento à cultura local a partir de investimentos das gestões locais (municipais e estaduais). Ainda que óbvio, a gestão municipal da Cultura em Maracanaú parece desconsiderar esse decreto, bem como as demais diretrizes de fomento à cultura do território, indicadas pelo Sistema Nacional de Cultura, através das quais as gestões estaduais e nacional estão reconstruindo as políticas de cultura no Brasil.
Repudiamos também essa subjugação e humilhação com os nossos músicos locais e demais trabalhadore(a)s da cultura, que se valem de seu ofício para com dignidade sobreviver da arte nesta cidade tão precarizada quanto as atividades artístico-culturais e total falta de estímulo do poder público municipal.
Essa mesma secretária de cultura em exercício, em reunião realizada semana passada, dia 08/06/2023, entre ela e os músicos da banda sinfônica de Maracanaú, destacou-se por coagir os músicos, quando insistia na frase: “- não tem mais banda sinfônica” na cidade. Segundo relato de vários músicos presentes, esse tom coativo persistiu durante toda a reunião, ao passo que ela afirmava que a banda havia “quebrado contrato”, quando em verdade estava apenas reivindicando mudanças urgentes na forma como se realizavam algumas apresentações solicitadas pela prefeitura, que recorrentemente expunha-os a condições inadequadas de infraestrutura e técnica para promoção das apresentações de uma banda sinfônica. A reunião resultou com a demissão do maestro e com o clima de instabilidade total entre os músicos que permaneceram. Desse modo, o primeiro ato da nova secretária de cultura e turismo de Maracanaú, foi demitir o maestro da banda sinfônica da cidade que defendia esse patrimônio cultural e reivindicava, junto de seus músicos, melhores condições para trabalhar e apresentar à população o resultado de muito trabalho ali desenvolvido.
O processo de admissão na banda sinfônica se dá através de edital público em que os músicos são submetidos a uma avaliação que inclui uma prova prática, escrita e auditiva e ao final uma entrevista. O maestro demitido é o competentíssimo Robson Lima, aclamado pensador da educação musical, um dos melhores maestros do estado, com formação especializada e extremamente comprometido com a qualidade de seu ofício e de sua banda, uma das bandas que executam músicas de alto nível de performance. . “Pedir condições melhores de trabalho”: esse foi o motivo pelo qual demitiram o maestro e acabaram com a banda sinfônica da cidade! Exigimos respeito com os profissionais que ali estavam.
Em nome dos integrantes da banda sinfônica repudiamos essa ação descabida e desproporcional da secretária em exercício de cultura de Maracanaú e da Prefeitura de Maracanaú, como repudiamos também a enorme discrepância entre os valores oferecidos pela Prefeitura para os cachês de músicos do município e shows de famosos.
Repudiamos o teor político e empresarial dos envolvidos na realização e promoção do São João de Maracanaú, distanciando o evento das expressões culturais juninas e da dinâmica cotidiana da cena cultural e do(a)s trabalhadore(a)s da cultura do município.
Exigimos um(a) secretária(o) a altura dos agentes culturais e da riqueza e diversidade cultural de Maracanaú.
Exigimos também a reestruturação das condições de trabalho e recontratação de todos os músicos da banda sinfônica demitidos e uma compensação pela indelicadeza, aspereza e desprezo causado a todos e a cada um.
Exigimos a ativação de um urgente processo de construção participativa do Plano Municipal de Cultura, considerando que a reativação do Conselho Municipal de Cultura já está em curso, depois de muita pressão da sociedade civil.
Assinam: Comitê de Cultura de Maracanaú
Sindicato dos Músicos Profissionais no Estado do Ceará
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